terça-feira, novembro 11, 2003
O meu guardião perdeu o seu caderno diário azul. Folhas imaculadamente em branco. Uma vida perdida. Aconchego-me mais no escuro. Respeito a sua dor.
Regresso de outra casa. Tal como a nossa, erguida com palavras. Tal como a nossa, a refazer fundações. Massa feita de corpos. A morte entre as fissuras.
Mordo uma laranja ao fim da tarde. E mordo. O sabor é sempre o mesmo. É mentira.
A marca na parede. O canto obscuro do quarto. Um não a ricochetear nas paredes. O crânio a explodir.
Tapa-me. Tenho frio. Sempre o mesmo frio. Tapa-me. Tapa-me. Tenho frio.
O rio de lava ascende à calçada e cobre-a de cinza. A casa desloca-se. Como o mundo. Perto da foz, agulhas de gelo.
Um xilofone com teclas de água. O meu guardião à procura de música.
Subtraí uma palavra ao mundo. Uma só. Inominável pedaço de carne. E ainda sangra.
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