Meditação idiota ao deitar-se sozinho
Se disseste, e repetiste em tantas ocasiões,
que o teu único amor é uma mala,
por que te queixas e protestas
enquanto olhas o tecto sobre a tua cama solitária.
Vítima, juiz e, por fim, verdugo,
ainda podes sentir que te comoves por alguém te amar,
mas tu escolheste, de certo modo, esse destino
e agora tens de pagar o preço.
Tu, que pronunciaste “amo-te” tantas vezes
para te rir de seguida da tua própria frase,
que esperas?, a quem pedes em vão?
Se quando encontras alguém que partilha os teus dias,
as tuas noites mais terríveis, a tua soma de fracassos,
tens medo de dizer-lhe “continuemos juntos sempre”
mesmo que seja uma frase, mesmo que não acredites nisso,
que fim é o teu?, que é que esperas?
E se também te queixas das grotescas farsas
que muitas vezes inúteis, inúteis, constróis,
com frívolas histórias, palavras mercenárias,
que pretendes?, que pedes à vida?
A vida não é um jogo, deveste compreendê-lo,
e se há algo muito claro é que envelheceste.
Conforma-te e aguenta, e não peças milagres,
que o vodka te acompanhe ao silêncio e ao sono.
Aos pés da tua cama, qual cadela com cio,
a morte, desperta, dá-te as boas noites.
Juan Luis Panero (in revista Belém [CCB] (dir. Alexandre Melo), nº 4, Abril de 2002: 105, trad. Joaquim Manuel Magalhães)
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