Há palavras a brilhar, a suster o avanço da noite. Mãos estendidas. Afectos.
sequência 1
«Ele quis morrer para arrasar a morte e voltar. Pensa: «No meu corpo depositei o mais e o menos, há porém ainda lugares onde salpicar o riso de água.» Sabia que estava no caminho da vocação do homem – romper, e o seu tumulto transporta uma memória já contida. De encontro aos olhos dele o mar teve medo e recuou. Lembra-se do amigo vestido de preto que chora agarrado às grades da cela. Ninguém põe as mãos no seu casco. É um exemplo. O homem jura que pode dizer hoje a qualquer mulher da cidade: fica calada e recosta-te. O sexo é a última violência, e tens o ventre dilatado. Devo servir-me de ti porque me purifico e os meus amigos renascem. O cabelo cai na testa do homem como certas hienas se enrodilham nas árvores. Tem algas dentro da boca, os membros são cardumes. Durante meses experimentou sentar-se no chão e soterrar o inferno no pó. Agora volta, e a sua pele brilha. Amou vorazmente, mas nada percebe do que amou. Foi uma bola batida. Assim partiu, e se hoje regressa do outro lado das campas para reabsorver Lisboa é porque quer dar início ao seu derradeiro trabalho. À beira da estrada pára o cansaço e queima-o.»
(José Amaro Dionísio, Bardo, Lisboa, Salamandra, 1986: 11-12)
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